E A VIDA CONTINUA


Neste mundo tudo passa.
Passa a noite, passa o dia.
Passa a dor, passa a alegria,
Passa o riso e a desgraça,
As linhas que o mundo traça.
Tudo que o homem cultua
A terra, o sol, a lua,
Passa, gira, vai mudando,
As coisas se transformando
E a vida continua.

Gerson Campos


PENSANDO EM BEIJOS


Se eu pudesse alcançar o céu,
eu satisfazia o meu desejo
de sacudir duas estrelitas com um beijo...
Se eu tivesse tido a sorte
de ter vivido nos tempos da magia,
eu teria beijado a “Boca da Noite”,
bem muito, com demasia,
embora recebesse um açoite.
Se eu fosse alpinista,
subiria as alturas
sem parar, sem parar,
para o “Dedo de Deus” beijar...
Eu beijaria se encontrasse
em noites de luar,
os cabelos da sereia.
Eu beijaria a fria e fina areia do mar.
Eu beijaria até o “Cabeça de Cuia”,
que a lenda explora,
porque beijar é tudo que minha alma adora...
Beijo é carinho,
saber beijar é arte,
beijar quem está perto,
beijar quem vem,
beijar quem parte.
Eu beijo o sol porque ele é quente,
eu beijo a lua porque é bela,
o sol me torna uma brasa ardente,
enquanto a lua a minha boca gela...
Beijar a vida inteira, sem contar as vezes,
beijar de mansinho,
beijar com violência,
“pois nada se parece tanto com a inocência
como a imprudência”...
Eu beijo tudo,
o luar, o mar,
um rosto, o gosto de beijar,
o vento e o pensamento,
pois nada é nada sem um beijo,
e eu gostaria de beijar o próprio beijo...


Gerson Campos / Recife, 10/05/69

NOTA DE FALECIMENTO DO POETA, ESTAMPADA EM “O COMETA”, DE FEVEREIRO DE 1973, DA LAVRA DO REPÓRTER POSSIDÔNIO QUEIRÓZ.


Morreu Gerson Campos! Morreu Gerson Campos! Morreu Gerson Campos! Dizia uma voz, num crescendo aflitivo, ao longo da Praça Cel.  Orlando Carvalho. Era um moço que descia do Estádio Municipal, onde se acabara de dar o encontro pebolístico Oeiras-Floriano, e onde vira, minutos antes, vibrando, aplaudindo, incentivando os jogadores, o inditoso Gerson, agora morto.
A notícia era, infelizmente, verdadeira. O coração de Gerson, esse moço tão querido em nossa Oeiras, deixara de pulsar. Deixara de bater o coração ainda jovem, que procurou, e soube viver intensamente a vida.
Amigo de todos, de moços, velhos, crianças, e sobretudo de moças, tinha para todos uma palavra chistosa, em que o coração é que falava. Ninguém lhe queria mal aqui; todos o estimavam.
Morreu moço, na idade em que hoje se começa a viver. Amou intensamente a vida. Poeta de fina sensibilidade, cantou, um tanto a Epicuro, a alegria sadia das cousas boas deste mundo.
A saúde lhe vinha abalada. Esteve à morte em princípios de 1971. O coração amorável e idealista, de uns dois anos para cá, não resistia, então, à carga de emoções que lhe era imposta. Era bom, mas se lhe exigia que fosse muito melhor. Amava a muitos, mas se lhe pedia que se transformasse num amazonas de afeto, e amasse a todos. Essa carga lhe foi um peso demasiado.
A Ciência o salvou naquele tempo e lhe prescreveu dieta de menos amor, e mais repouso; que as emoções, como um veneno, também mata.
Gerson, o nosso caro Gerson; o companheiro do Instituto Histórico de Oeiras, a que emprestava o calor do seu idealismo; o colaborador ilustre de “O COMETA”, a que mandava seus versos inspirados; não obedeceu aos conselhos da Ciência. A vida para ele não era estagnação, repouso sem fim, que isso lhe estava sendo insuportável; mas movimento, bulício, luz, festas... E Gerson encontrou a morte.
Morreu Gerson! Seriam seis horas da tarde de hoje, 11 de fevereiro de 1973, quando desapareceu, fulminado traiçoeiramente pelo mesmo coração que lhe fornecera a vida.
Ao bom amigo Joel Campos, seu digno genitor; aos seus irmãos Dr. Gerardo Majella, casado com a Srª Carlota Campos; Antônio Nogueira Campos, casado com a Senhora Laurita Siqueira Nunes Campos; Professoras Amália e Rita Campos; Senhora Aldenora Campos Reis, casada com o Sr. Benedito de Macêdo Reis; Sr. Joel Filho, casado com a Senhora Lourdes Campos e demais familiares, envia “O COMETA”, a expressão sincera do seu profundo pesar.